A regulação da cobrança de eixo suspenso: avanço tecnológico tornou possível efetuar a arrecadação nos contratos de rodovias.
A questão dos eixos suspensos nos pedágios é um tema polêmico e complexo, que envolve aspectos jurídicos, econômicos e sociais. Por um lado, a Lei dos Caminhoneiros visa proteger os trabalhadores do transporte rodoviário de cargas, que enfrentam altos custos operacionais e baixa remuneração. Por outro lado, a cobrança de pedágio por eixo suspenso é uma forma de garantir o equilíbrio financeiro dos contratos de concessão de rodovias, que preveem investimentos em infraestrutura e manutenção das vias. Além disso, a suspensão indevida de eixos por veículos carregados gera um impacto negativo na segurança viária, na qualidade do pavimento e no meio ambiente, pois aumenta o desgaste da pista e a emissão de poluentes.
Diante desse cenário, foi necessário buscar soluções que conciliem os interesses dos diversos atores envolvidos, respeitando a legislação vigente e os princípios da modicidade tarifária e da continuidade do serviço público. Uma possível alternativa seria a adoção de sistemas inteligentes de pesagem e identificação dos veículos nas praças de pedágio, que permitissem diferenciar os veículos vazios dos carregados e aplicar as tarifas correspondentes. Outra medida seria a intensificação da fiscalização e da punição dos infratores, por meio de multas e outras sanções administrativas.
Desde 2018, Lei Federal nº 13.103/15 (conhecida como Lei dos Caminhoneiros) proíbe essa cobrança em todo o território nacional para veículos vazios. Como consequência, no Estado de São Paulo, a Resolução SLT nº 04/2018 foi editada e suspendeu a cobrança de eixos suspensos com base na mesma lei, considerou como vazios os veículos de carga que atravessam as praças de pedágio com um ou mais eixos suspensos. Essa isenção deveria ser implementada por meio de medidas técnicas e operacionais.
As concessionárias paulistanas alegaram que isso feriu seus contratos de concessão e prejudicou seus investimentos. Consequência disso, deixaram de arrecadar milhões de reais por ano com a proibição de cobrança por eixo suspenso.
Para as federais, essa modalidade de cobrança foi autorizada pela Resolução nº 5.862/2019 da ANTT, que regulamenta o serviço de transporte rodoviário de cargas.
Em 2022, houve considerável avanço na regulação federal sobre esse tema, que abriu um precedente importante para as concessões estaduais. A ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e a Secretaria da Fazenda firmaram um acordo de cooperação técnica para compartilhar informações sobre os Manifestos Eletrônicos de Documentos Fiscais (MDF-e) não encerrados. O MDF-e é um documento digital que registra a carga transportada pelo veículo, o seu peso, o seu destino e o seu valor.
O objetivo do acordo é garantir a isenção da cobrança de pedágio em veículos de carga que circulam com eixos mantidos suspensos e vazios, evitando assim a evasão fiscal e o desgaste das rodovias. Por meio desse acordo, os estados fornecem à ANTT informações sobre a existência de MDF-e não encerrados, que indicam que o veículo ainda não entregou a sua carga. Assim, quando um veículo de carga passa por uma praça de pedágio em uma rodovia federal sob administração da ANTT, a concessionária consulta o MDF-e associado à placa desse veículo e verifica se ele está vazio ou não. Se o MDF-e indicar que o veículo está vazio (mesmo com eixos suspensos), a isenção de pedágio é aplicada. Caso contrário, a concessionária tem o direito de cobrar o pedágio, mesmo se os eixos estiverem suspensos.
Em março de 2023, a Ecovias do Araguaia foi a primeira concessionária federal a implementar essa medida e passou a cobrar pedágio de veículos de carga com eixos suspensos, com base nas informações do MDF-e. Essa iniciativa serviu como referência para as rodovias estaduais paulistas, que por meio da Resolução Conjunta SPI/SEMIL 001 também adotaram essa forma de cobrança em setembro de 2023. Essa resolução estabelece três requisitos para que os veículos de carga não sejam considerados vazios: (i) apresentação do MDF-e não encerrado; (ii) peso bruto total do veículo incompatível com tal condição; e (iii) a partir de avaliação visual, não forem verificadas tais condições.
Em nossa prática, tivemos a oportunidade de advogar sobre o tema em pareceres emitidos para concessionárias paulistanas e, sempre visando a excelência técnica, nos posicionamos no sentido de que era possível a cobrança de eixo suspenso desde que comprovado não se tratar de veículo vazio, mas de tentativa de evasão de pedágio.
Felizmente, nossa posição se concretizou de forma positiva na conclusão deste tema. Resta agora a análise sobre o reequilíbrio econômico-financeiro dos anos em que não houve a cobrança de eixo suspenso, mas existem inúmeros registros de evasão de pedágio para evitar a cobrança por eixo e consideráveis impactos contábeis negativos na equação econômico-financeira dos contratos.