Após receber os comentários e contribuições de agentes do mercado sobre a proposta inicial de evolução do Regulamento do Novo Mercado1, a B3 divulgou, no último dia 10 de outubro, uma segunda versão da consulta pública a fim de aprofundar e trazer uma nova etapa de discussão a respeito das alterações das regras (Consulta Pública nº 2/2024-DIE).
O Regulamento do Novo Mercado busca disciplinar as atividades da (i) B3, na qualidade de entidade administradora de mercado de bolsa, (i.a) na verificação do atendimento, pelas companhias, aos requisitos mínimos para ingresso, permanência e saída do Novo Mercado, e (i.b) na fiscalização das obrigações estabelecidas no Regulamento; e (ii) das companhias, na observância dos requisitos para participação do Novo Mercado.
As alterações propostas pela B3 se baseiam nos mais elevados padrões de governança corporativa, buscando fortalecer a estrutura de governança das companhias listadas no Novo Mercado. A segunda consulta é dividida em dois blocos principais: tópicos centrais da reforma, e questões acessórias.
Novo Mercado Alerta
Inicialmente, a B3 havia proposto a colocação do selo do Novo Mercado “em revisão” em determinadas hipóteses, medida cautelar que visava sinalizar aos investidores situações específicas que poderiam afetar uma companhia por razões econômicas, de imagem ou relacionadas à administração.
Na Consulta Pública, a proposta é a modificação do nome para “Novo Mercado Alerta”, com a redução da lista de hipóteses que levam ao alerta. As situações previstas são:
- divulgação de fato relevante que demonstre a possibilidade de erro material nas informações financeiras, conforme definido pelas normas contábeis brasileiras, incluindo aqueles relacionados à fraude2;
- atraso superior a 30 dias na entrega das informações financeiras, em relação à data limite prevista na regulação3;
- relatório dos auditores independentes com opinião modificada4;
- solicitação de recuperação judicial ou extrajudicial no Brasil ou procedimentos equivalentes em jurisdições estrangeiras5.
De acordo com a nova proposta, a B3 solicitará informações às companhias a fim de que se manifestem previamente à emissão do alerta.
Limitação de participação em conselhos de administração
A proposta inicial da B3 visou restringir a participação em conselhos de administração, com o objetivo de adequar o tempo considerado razoável à dedicação desses profissionais nos conselhos de administração que ocupam. Assim, propôs a B3 as seguintes limitações:
Cargo - Máximo de conselhos:
- Regra geral - 5 conselhos.
- Presidente do conselho de administração – 1 presidência: pode participar, como membro, de mais 3; – 2 presidências: pode participar, como membro, de mais 1.
- Diretor estatutário - 2 conselhos.
- Diretor presidente ou principal executivo - 1 conselho.
A limitação proposta inicialmente também seria aplicada a cargos ocupados em companhias do mesmo grupo econômico.
A B3 manteve a proposta inicial, mas incluiu algumas exceções6 para fins de cálculo de apuração do limite de conselhos de administração ocupados simultaneamente. Serão contados como uma única posição:
- os cargos ocupados nos conselhos de administração e diretorias de companhias:
- controladoras, controladas ou sob controle comum;
- que tenham suas demonstrações financeiras anuais consolidadas; ou
- integrantes de um mesmo grupo de sociedades, tal como definido na Lei nº 6.404/1976;
- o diretor-presidente ou principal executivo que ocupar cargo no conselho de administração da própria companhia.
Tais exceções reconheceriam os efeitos positivos decorrentes de relações com sinergia – como a coordenação, comunicação e transferência de conhecimento, que demandam menos tempo e menor custo quando os cargos ocupados são, de alguma forma, relacionados entre si.
Limite de mandatos para conselheiros independentes
Inicialmente, a B3 havia proposto que os membros independentes de companhias listadas no Novo Mercado pudessem ter tal qualificação somente até o 10º ano consecutivo de atuação no conselho.
Após as manifestações dos participantes do mercado, a B3 propôs o aumento do prazo para que o conselheiro de administração seja considerado independente até o 12º ano de atuação no conselho, sendo certo que a contagem do prazo se dará a partir do momento em que a companhia for listada no Novo Mercado.
Com relação ao período de cooling off, a B3 mantém a proposta inicial. Assim, caso o conselheiro se afaste completamente da companhia por, no mínimo, 2 anos, poderá retornar ocupando o cargo de conselheiro independente, passando a reiniciar a contagem do prazo de 12 anos.
Confiabilidade das Demonstrações Financeiras
Na primeira consulta pública, a B3 propôs que o diretor presidente (ou principal executivo da companhia) e o diretor financeiro (ou executivo responsável pelas demonstrações financeiras) apresentem declarações sobre a efetividade dos controles internos da companhia, a serem apresentadas juntamente com o relatório anual da administração. À época, considerou necessário, ainda, que essa declaração seja confirmada por um trabalho de asseguração, a ser feito por empresa de auditoria independente.
Tendo em vista a relevância da eficácia das estruturas de controles internos e necessidade de supervisão pela alta administração das companhias listadas no Novo Mercado, a B3 manteve a necessidade de declarações, por esses diretores, sobre a efetividade dos controles internos da companhia, mas possibilitou que a declaração seja apresentada no relatório anual da administração, no formulário de referência ou em documento apartado.
Após análise dos comentários e sugestões dos participantes do mercado7, a B3 optou por retirar a obrigatoriedade do relatório de asseguração por auditores independentes.
Sanções
Em sua proposta inicial, a B3 havia sugerido a possibilidade de imposição de penalidade de inabilitação, pelo prazo máximo de 10 anos, para o exercício de cargo de administração, membro do comitê de auditoria e membro do conselho fiscal em razão de descumprimento a regras relativas à fiscalização e controle. Também foi apresentada proposta a respeito de aumento das multas no processo sancionador, conforme a Resolução CVM nº 45/2021 (Resolução CVM nº 45).
A B3, levando em consideração os argumentos8 das manifestações contrárias ao aumento dos valores, mantém as multas já definidas no Regulamento em vigor. Entretanto, visando que as companhias, seus administradores e acionistas tenham maior clareza e previsibilidade acerca do valor da multa a ser aplicada em caso de descumprimento ao Regulamento do Novo Mercado, mantém-se a proposta de inserção dos critérios de dosimetria da pena, por meio de situações agravantes e atenuantes, inspirado na Resolução CVM nº 459.
Adicionalmente, a B3 propôs que o critério de correção monetária das multas deixasse de ser pelo IPCA e passasse a ser pela variação positiva anual da taxa de Depósito Interbancário, com intuito de manter a proporcionalidade, ao longo do tempo, dos valores das multas com os prejuízos que as condutas irregulares possam acarretar.
Arbitragem
A B3 propôs flexibilizar a obrigatoriedade prevista atualmente de que as companhias integrantes do Novo Mercado designassem, em seu estatuto social, a Câmara do Mercado (CAM) como a competente para solucionar as controvérsias societárias.
Na proposta inicial, ficaria a cargo da CAM realizar o credenciamento de câmaras de arbitragem que possam vir a constar nos estatutos sociais das companhias listadas.
Após as manifestações sobre o tema, a B3 propõe um ajuste a fim de que os critérios para o credenciamento de outras câmaras sejam aprovados pelo conselho de administração da B3, haja vista sua competência para definição de outras questões envolvendo a própria CAM.
Outros tópicos
A B3 mantém a proposta de divulgação do número de denúncias recebidas por ano via canal de denúncias, entretanto, deixa de demandar a natureza e as sanções aplicadas, passando a solicitar, além do número de denúncias recebidas, somente o número de sanções aplicadas.
Por fim, a B3 complementou o dispositivo que trata da composição do Comitê de Auditoria Estatutário a fim de deixar expresso que a vedação aplicável à participação de diretores da companhia, de suas controladas, de seu controlador, de coligadas ou sociedades sob controle comum, abrange a participação de pessoas subordinadas aos diretores e ao acionista controlador de tais sociedades.
Tópicos sem ajustes
A B3 manteve suas propostas iniciais sobre os seguintes temas: comitê de auditoria estatutário, encontros trimestrais entre comitê de auditoria e auditor independente, obrigação de lavratura de ata10, avaliação e monitoramento das exposições de risco da companhia, possibilidade de um único canal de denúncias, previsão expressa de adesão ao Novo Mercado, anonimato, mudança do prazo para entrada em vigor das alterações, prorrogação de prazo para defesa e recurso e adaptações normativas.
A B3 receberá comentários sobre as propostas trazidas na Consulta Pública nº 2/2024-DIE até o dia 11 de novembro de 2024, por meio do e-mail [email protected].
Para mais informações sobre a Consulta Pública nº 2/2024-DIE, clique aqui.
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1- Para saber mais sobre a Consulta Pública nº 1/2024-DIE, de 03 de maio de 2024, clique aqui para acessar a newsletter elaborada pelo escritório sobre a matéria.
2- A companhia permanecerá em alerta até que seja apresentada uma demonstração financeira anual com a correção das falhas contábeis.
3- A companhia permanecerá em alerta até que sejam apresentadas as informações financeiras.
4- A companhia permanecerá em alerta até que seja apresentado relatório dos auditores independentes sem opinião modificada.
5- A companhia permanecerá em alerta até que seja encerrada a recuperação judicial ou extrajudicial – ou procedimento equivalente em jurisdições estrangeiras – e retomadas as atividades usuais da companhia (a falência implicará a deslistagem compulsória da companhia).
6- Para fins de contagem dos limites descritos, membros suplentes – até o momento em que comecem a fazer parte das reuniões nos casos de vacância de membros efetivos – não são contabilizados.
7- No geral os argumentos apresentados baseiam-se no (i) aumento dos custos com auditoria independente, (ii) adaptação, ainda em curso, à Resolução CVM nº 193/2023, e (iii) discussões acerca da necessidade de edição de regras específicas de auditoria.
8- Dentre os argumentos citados, têm-se que: (i) medida desta natureza não deveria ser aplicada no contexto da autorregulação voluntária; (ii) a medida seria contraditória, pois estaria restrita apenas ao Novo Mercado; (iii) a B3 não teria competência para sua aplicação; e (iv) os custos com seguros D&O e acordos de indenidade seriam elevados.
9- A pena-base, seguindo o estipulado pela Resolução CVM nº 45, passa a ser definida a partir dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, capacidade econômica do infrator e os motivos que justifiquem a imposição da penalidade, sem a definição de patamar pré-determinado.
10- Sem obrigatoriedade de divulgação.